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segunda-feira, 16 de agosto de 2021

Crônica de Inverno


Estava eu aqui, desolado ,levemente aquecido pelo calor que o fogão emanava. Resolvo me encostar  na cadeira e dar a devida atenção para cena que se desenrolava a poucos metros de mim. Há um homem, já velho, com oitenta e três anos (creio eu),tomando em sua simpática xícara amarela, um cheiroso e esfumaçado café preto. Ele tem cabelos despenteados e seu semblante é cansado. A noite já anunciava o típico frio de inverno e como todos os fins de tarde, mais uma vez o homem devorava as bolachas secas, os farelos voando felizes pela mesa. Sacos de biscoito e adoçante dietético, repousam como quem não quer nada, ao lado do radinho azul, o qual embala essa fria noite com músicas que faziam o homem retornar a sua juventude e lembrar como tudo era mais fácil.                                                                    
            Terminada a sonolenta música, de acordes suaves e tristonhos, ele senta-se no banquinho em frente ao fogo que estala e crispa ruidosamente. Era o único som que se espalhava pela cozinha circular. Endireito-me na cadeira e arrumo as almofadas de lã mesclada. Observo novamente o homem, agora com mais curiosidade que antes.  Ele não comia,  nem cantava, nem aquecia-se. Para minha surpresa ,ele dançava uma valsa solitária e rodopiava como se realmente estivesse com sua amada nos braços!                                                                                                                      
          Até o olhar, antes cansado e desiludido, brilhava tanto quanto a chama avermelhada ao meu lado. Ele lembrou-se, dizendo-me mais tarde, de como dançava em noites como essas, com sua mulher.                                                                                                                   Era uma paixão que o tempo não apagaria, como apaga os dizeres na areia,  nem congelaria, como a brisa faz com as folhagens mais novas. E cada vez que ele ouvia o som do estalar da madeira quente, acompanhado do café que sua mulher fazia tão bem, ele sabia que não estava só. Estava em memória com seu antigo, porém tão vívido, amor.
Pedro Barcellos - 15 de junho de 2010

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